07 novembro, 2011

Por Fátima Garcia

Sobre os trabalhos de Cristina Oliveira:

Fluidez e contradição, afirmação e negação, contemporaneidade e tradição: ambivalência, eis o sentido mais próximo para a produção atual de Cristina Oliveira. A artista faz uma variação em si e em suas construções estéticas que vão de aquarelas às performances, intervenções urbanas e poéticas visuais. Transita nas linguagens artísticas com a mesma espontaneidade e leveza de uma criança que saboreia um picolé. Nas ambiências criadas pela artista há justo isso: um misto do sonho pueril e a realidade do desejo feminino. Quando penso que ela brinca, fala sério e quando a tomo no discurso da tradição, são ensaios livres do seu pensamento gráfico em devaneio. Perceber quando e quem está em atividade em sua produção é também um exercício para o diálogo entre nossos próprios personagens internos, um misto de inocência e sedução.

Em Corpo e Nuvem a relação da matéria e da imaterialidade na arte coexiste com a utilização do corpo e seus gestos, através das mãos e do destaque às unhas pintadas em um emaranhado de tule, um quase tecido que serviu de suporte, de armação às saias ou anáguas femininas em um passado já tão distante, é o material dos véus das noivas e também mecanismo de proteção. Cristina oscila entre os movimentos de contenção e expansão, entre intenções de um querer para si e um doar ao outro. A dualidade não está só nos elementos utilizados, mas também em uma possível relação entre o particular e o plural, o individual e o universo, algo que nos remete a uma relação com a alteridade, de um eu em afirmação e um outro, em estado de potência.

A mescla dessas ligações cria na estética de Cristina Oliveira uma temática humana bem característica que toma uma escrita própria, como em Memorial da Espera, uma poética feita de memórias, de afetos, de letras e palavras em trânsito, nas fronteiras de sua imaginação e do campo fenomenológico que proporciona aos seus leitores. Ao desenrolar de seu trabalho-objeto, a experiência amorosa e de um estado de saudade instauram a questão da duração, do tempo, da existência, da transição, do pertencimento e também da solidão humana. Interfaces variadas são seu combustível. Ela se refaz e se repete em maneiras desiguais no seu discurso visual e poético, de beleza, suavidade, profundidade e efemeridades circunstanciais. Vale à pena conferir e se contaminar com as suas e nossas questões essenciais, um bom motivo para visitar seu limbo, lugar e não-lugar onde processos mentais, estéticos e sentimentais se completam.

Fátima Garcia.
MSc em Teoria e Crítica de Arte - EBA/UFRJ e
Profª. Artes Visuais UNIFAP-AP.